Aposentadoria é o que sustenta a chamada “Terceira Idade”. Sem a aposentadoria não há como usufruir dessa tida por otimistas como “a melhor idade”: sem compromissos, sem paletó e gravata e até sem lenço nem documento. Bingos (foram proibidos), bailão para viúvos/as, dominó com os amigos na praça. E, para alguns que nada aprenderam na vida, uma infeliz “happy hour” no Bar do Zé. Digo infeliz porque consumir álcool diariamente na aposentadoria é, realmente, se aposentar da vida - senilidade, irritação, pressão alta, taquicardia, pouco apreço, crises domésticas....
Muitos encaramos a aposentadoria como uma segunda chance de aproveitar a vida.
Lembro aquele diabozinho sempre perguntando ao pecador recalcitrante: E aí, quando vamos começar a viver – bebidas, mulheres, farras?
E o tentado dizia, aos 20 anos: “tenho tempo e disposição, mas não tenho dinheiro”.
E depois, aos 40 anos: “tenho disposição e dinheiro, mas não tenho tempo”.
E afirmava aos 60 anos: “tenho dinheiro e tempo, mas não tenho disposição”.
E assim não viveu a vida. Ou pelo menos a vida que o diabo esperava dele.
Há uma hora em que nos convencemos que chegou o momento de parar. Não percebemos os filhos crescerem, não notamos os mais jovens tomando nossos lugares, não sentimos o envelhecer; mas de um golpe tudo se faz sentir.
Minha empresa tinha um programa de renovação de seus quadros que consistia em juntar os novos empregados aos velhos e a cultura da empresa fosse se transferindo pela convivência, e oferecia um programa de demissão voluntária, pagando um determinado valor para cada ano na empresa. E, não menos importante, um projeto de reciclagem onde esses demissionários faziam um curso de uma semana, longe da empresa e junto com seus colegas de plano, sobre como se preparar para a aposentadoria. Palestras jurídicas, de finanças pessoais, de entretenimento, de empreendimentos comerciais, tudo para aceitar sem traumas a aposentadoria.
Como disse outro dia no blog, a síndrome de quem se aposenta e não se prepara para isso (sobretudo uma ocupação que lhe ocupe os neurônios, não dançar nos encontros de terceira idade ou jogar xadrez na praça) é o vazio, a impotência (não manda mais em ninguém), a inutilidade (ninguém lhe pergunta mais nada), a perda de status (sem motorista, sem carro, sem secretária). Há ainda, normalmente, uma perda salarial.
Para os militares é pior ainda: o quartel foi durante 30 e 40 anos sua grande família. De repente ninguém mais lhe faz continência; chamam-no de Zé no lugar de Coronel ou General, e não tem a quem comandar.
Em casa o aposentado perturba a esposa (mas como você é relaxada, são 9 horas e a casa está uma bagunça) briga com os filhos (você não devia estar estudando), hostiliza o cunhado ou a sogra que moram com ele etc.
Já o aposentado da iniciativa privada a pensão é tão pequena que ele não para nunca. Outro dia vi numa esquina um ex-administrador de meu condomínio vendendo jornais, profissão de jovens que aguardam uma melhor oportunidade profissional.
Depois dos 50, particularmente na época da aposentadoria, sintomas como apatia, conformismo, depressão, sensação de vazio e inutilidade sinalizam para a chegada de uma crise. O que fazer? É a pergunta mais frequente. Mas essa fase não é, necessariamente, um beco sem saída, reafirmam especialistas no envelhecimento.
As psicólogas Márcia Stocker Pinto e Maria Teresa Milagres trabalham diretamente com pacientes que apresentam problemas quanto à chegada da aposentadoria. Autoras do projeto Travessia A Cena Que Muda, desenvolvido pela PUC do Rio de Janeiro, elas tentam provar que, com boa dose de otimismo e alguma determinação, é possível passar por esse período turbulento e superar as fissuras.
O dilema que se instala tem duas vias. O que fazer com o tempo depois da aposentadoria e o que fazer para retornar ao mercado, caso a opção seja por continuar trabalhando.
No primeiro caso a escolha é pessoal. No segundo, a recomendação é cautela. É preciso que essas pessoas pensem sobre o que devem fazer para voltarem ao trabalho. “O mercado quer o idoso para ganhar menos, ou servir ao trabalho comunitário. Se você entrar numa de rolo compressor, trabalhar só por trabalhar”, não dá certo, explica Maria Teresa.
“Uma das propostas do projeto Travessia é ajudar os pacientes a descobrir a possibilidade de novos caminhos. É fundamental que acreditem neles mesmos, em seus potenciais. Por isso trabalhamos suas autoestimas”, diz Teresa.
“Com uma boa autoestima, é bem mais provável ter motivação para agir. É hora de observar aspectos quanto às modificações nas suas relações de trabalho. Redimensionar suas capacidades de relação e se desenvolver como pessoa, descobrindo através da criatividade, um novo projeto de vida. Recuperar projetos abandonados. Desta forma, há mais tranquilidade para o planejamento do processo de mudança”, finaliza Márcia Stocker.
Dezembro lembra festa, que lembra ano novo, que lembra planos. Nessa época do ano, chovem promessas e desejos de mudanças. Quem nunca ouviu frases como "Vou abrir meu negócio no próximo ano", ou "Em 2014, vou começar a ginástica"? Mas elaborar um projeto de vida não é tão simples quanto fazer um pedido e pular sete ondas. Requer tempo, reflexão, coragem e determinação.
Segundo a psicóloga e consultora Ana Fraiman, um projeto de vida é uma visão de futuro, e deve estar relacionado com algo que faça sentido, que tenha um significado profundo. "Um projeto envolve escolhas, mudanças de comportamento, firmeza de atitudes. É um traçado que reflete os valores principais de alguém, aquilo pelo qual se deseja lutar e fazer prosperar", define a consultora.
Para ela, diferente do que se costuma pensar, não é mais difícil ir à busca dos sonhos aos 50. Pelo contrário. "As pessoas estão mais conscientes e, portanto, têm mais discernimento ao escolher. Quando se é jovem, é fácil embarcar nos projetos de vida alheios. Nessa etapa da vida, só se age e persevera se o projeto for próprio, pois as pessoas maduras não aceitam ser manipuladas", destaca.
De acordo com a consultora, elaborar um projeto de vida na terceira idade não é muito diferente de quando somos crianças e pensamos no que queremos ser quando crescer. Na maturidade, imagina-se o que se quer ser durante o envelhecimento. O problema é que muitos "cinquentões" terminam se boicotando antes mesmo de começar a planejar.
Segundo a psicóloga Rosana Mafra, eles se comportam como se todos os desafios e projetos já tivessem sido vivenciados no passado.
Um baixo grau de autoconhecimento também pode dificultar a elaboração de projetos de vida. "Se não me conheço suficientemente, se não tenho claros para mim quais são os meus principais valores, em que acredito, o que quero realizar na minha vida, enfrentarei mais dificuldade para construir um projeto em consonância com minhas necessidades e com minha visão de mundo", alerta Rosana.
Superados os bloqueios, por onde começar? Rosana explica que o primeiro passo é abandonar crenças como "Já estou velho demais para sonhar" ou "Já realizei tudo que planejei". Em segundo lugar, fazer uma auto-avaliação, questionando-se que desejos e sonhos ainda não foram alcançados. A terceira etapa é pensar porque ainda não se chegou lá. "Levantados os impedimentos, que podem ser, por exemplo, timidez ou falta de coragem, identifica-se as ações que serão adotadas para vencer estes obstáculos", explica Rosana. O passo seguinte é concretizar os planos. "A realização de cada um, por menor que seja, será um combustível importantíssimo para a pessoa se manter motivada a continuar", completa.
Para dar aquele empurrãozinho final, Ana lembra que ter um propósito na vida é o que ajuda a prosseguir. "Quando nos sentimos totalmente abatidos, só renascemos quando a vida volta a fazer sentido. E isso pode acontecer de uma hora para outra: um olhar de uma criança, uma boa palavra de alguém, uma flor que se abre, um cachorrinho que nasce, qualquer coisa que volte a nos comover e, assim, sentir que estamos vivos", define.
Rosana ressalta que acreditar, agir e acrescentar uma boa dose daquela "teimosia saudável" vão fazer você chegar lá. Afinal, basta lembrar-se da memorável frase citada pelo ator John Barrymore: "Os homens só envelhecem quando os lamentos substituem os sonhos.
Os Dez mandamentos da Terceira Idade
1º Não se aposente da vida para se tornar a praga da família. A vida é atividade e o verdadeiro elixir da eterna juventude é o dinamismo. Não despreze as ocupações enquanto tiver energia para as lutas cotidianas.
2º Seja independente e preserve sua liberdade mesmo que seja dentro de um quartinho. Quem renuncia ao próprio lar, obriga-se a andar na ponta dos pés para evitar atritos com noras, genros, netos e outros parentes.
3º Mantenha o governo de sua própria bolsa. Ajude seus filhos financeiramente, na medida das suas posses, reserve uma parte para emergências e lembre-se que um filho ambicioso pode ser mais temível que um inimigo.
4º Cultive a arte da amizade como se fosse uma planta rara, cercando os familiares de cuidados, como se fossem flores. Se sua memória estiver falhando, anote numa agenda sentimental as datas mais importantes das suas vidas e compartilhe com eles a alegria de estar presente.
5º Cuide da sua aparência e seja o mais atraente possível. Não seja um daqueles velhos relaxados, que exibem caspa na gola do paletó e manchas de gordura na roupa que revelam o cardápio da semana. Nunca despreze o uso de água e sabão.
6º Seja cordial com seus vizinhos. Evite implicar-se com o latido do cachorro, o miado do gato, o lixo fedorento na calçada ou o volume do rádio. Um bom vizinho é sempre um tesouro, especialmente se os parentes morarem distantes.
7º Cuidado com o nariz e não se intrometa na vida dos filhos adultos. Eles são seres com cérebro, coração, vontade e contam com muitos anos para cometerem seus próprios erros.
8º Fuja do vício mais comum da velhice, que é a "Presunção". A longa vida pode não lhe ter trazido sabedoria. Há muitos que chegam ao fim da jornada tão ignorantes como no início dela. Deixe que a “Humildade” seja a sua marca mais forte.
9º Os cabelos brancos não lhe dão o privilégio de ser ranzinza e inconveniente. Lembre-se que toda paciência tem limite e que não há nada mais desagradável do que alguém desejar a sua morte.
10º Não seja repetitivo, contando a mesma história três, quatro, cinco vezes. Quem olha só para o passado, tropeça no presente e não vê a passagem para o futuro.
(Adaptação de “Compreendendo Melhor Como Viver a Terceira Idade, na Opinião da Terceira Idade”, do Dr. Conceil Corrêa da Silva)
(*) Este artigo contém conceitos de outros autores que receberam o respectivo crédito.
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