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Vanio Coelho

VANIO COELHO

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A nova moral da mulher sozinha



As sufragettes foram às ruas nas décadas passadas para defender o direito de voto, Valentina Tereshkova subiu ao cosmos, atrizes como Marilyn, Brigitte e Liz Taylor construíram e desmancharam casamentos à sua maneira e, hoje, no Brasil, sete milhões de mulheres trabalham fora de casa lado a lado com os homens.


Quando se tornam acesos os debates sobre limitação de filhos, divórcio e o próprio casamento, que papel estará reservado, no mundo, para a mulher solteira? Com tantos direitos conquistados a duras penas, a mulher pode viver sozinha ou o celibato será sempre passageiro? Marginalizada ou não, a mulher solteira da segunda metade do século XX já não é mais aquela “solteirona” que ia aos bailes fazer crochê e se enquadrava numa moral puritana jamais ditada por ela. As mulheres solteiras já não se sentem castigadas por insistirem em sua independência e personalidade. Ao contrário, procuram reagir contra as limitações impostas pelo mundo exterior. Embora nem todas sejam solteiras por vontade própria (desquitadas, viúvas ou abandonadas pelos maridos), o que se nota é que, cada vez mais, aumenta o número de mulheres que abrem caminho por conta própria - ligadas ou não a algum homem, mas conservando sua situação de celibatárias. Mas o fato que ocuparem posições de destaque nos escritórios, mostrarem sua eficiência nas fábricas e lecionarem com êxito nas faculdades, pode criar-lhes uma série de problemas. Desde alugar um apartamento para nele morar sozinha até pleitear ingresso num clube, os preconceitos ainda se somam. Muitos regulamentos recebem mal as mulheres solteiras e o tratamento de uma colega casada pode ser diferente dentro e fora do expediente de trabalho. Aí, falam mais alto as tradições familiares e sociais.





ANTES E DEPOIS


Não existe uma estatística precisa sobre o número de mulheres solteiras, principalmente por não existir um critério que permita, sem preconceitos, determinar quando ela deixa de ser “mocinha” para se transformar em “solteira”. Além disso, os hábitos arraigados fazem uma distinção entre a celibatária (a que nunca se casou) e a desquitada (que retornou à condição primitiva depois de uma experiência matrimonial frustrada). Esta discriminação velada, no entanto, estaria aumentando, numa espécie de desafio, a quantidade de mulheres solteiras cada vez mais importantes nas artes, na docência, nos escritórios e, não com menor destaque, no jornalismo e atividades públicas? Uma mulher que, sozinha, galgou posição destacada nas letras, perguntou-me: “Você conhece alguma casada que ficou famosa por conta própria?”


DINHEIRO E TRABALHO


Tudo indica que, apesar das dificuldades (ou em função delas), o mundo da mulher solteira oferece melhores condições de adaptação. Por isto, as mulheres foram trabalhar fora do lar, já que a independência feminina está ligada à auto-suficiência econômica. Não é só no Brasil que sete milhões de mulheres trabalham lado a lado com os homens; 44% dos que trabalham na Tchecoslováquia são mulheres; 49% na Rússia; 29% na Iugoslávia; na Inglaterra as mulheres constituem a terça parte dos empregados em indústrias manufatureiras. As legislações mais evoluídas começam a levar em conta não apenas a liberdade da mulher solteira, como também a da casada (veja-se no Brasil a Lei da Mulher Casada e o anteprojeto do novo Código Civil). Casar, hoje, não pode continuar sendo, para a mulher, apenas uma questão de assistência econômica por parte do marido. O que as mulheres solteiras mais alardeiam é sua liberdade. A mulher casada, não rato, sente-se vítima de uma “nostalgia do celibato” ou mesmo de uma frustração matrimonial.


AS VANTAGENS


Que significa para a mulher, apesar das dificuldades inerentes, permanecer ou voltar a ser celibatária? Uma atriz brasileira, que reside em Copacabana, revelou-me numa entrevista recente: “O fato de eu não me casar traz-me muitas vantagens. Evita o tédio e nenhum homem se sentirá com autoridade sobre mim. De outro modo isso me privaria de passar os fins-de-semana onde me agrada, viajar sozinha ou ir à praia no horário que desejar.” Quantas mulheres teriam coragem de romper com a segurança, a tranquilidade, mas ao mesmo tempo mediocridade que impõe a “despersonalização” - conforme se queixa uma mãe de família entrevistada? Poucas são, realmente, as que têm coragem em não se sujeitar a ser apenas “Senhora Fulano de Tal...”, como nenhum homem gosta de ser chamado de “marido de Fulana...” Para essas, hoje em dia, o casamento teria de ser menos patriarcal...


OPINIÃO PESSOAL


“Você conhece alguma mulher que possua opinião própria, isto é, diferente da do marido, sobre política ou artes, que tenha seu jornal preferido, ou que escolha, sozinha, programas para fim-de-semana?” - pergunta uma jovem senhora, de 26 anos, casada, que confessa depois: “Antes do casamento eu tinha minhas opiniões e gostos pessoais, que tive de sacrificar.” “Uma manhã, uma jovem senhora - casada, com dois filhos - decidiu não se levantar da cama para enfrentar toda aquela rotina que vinha corroendo-a dia a dia, mês após mês, nos seus anos de casada. Ela então se afunda no leito e se revolva contra o quotidiano. Chora, enraivece-se e começa a recordar os bons tempos dos blue-jeans, da pintura, da natureza e da liberdade. Por algumas horas, ei-la diferente da imagem que sua família dela fazia: doce, amorosa, previdente, maternal. Mas ao fim do dia ela se dará conta de que as conveniências sociais e a engrenagem da vida em comum com outros seres representam uma força muito envolvente, não mais ousará romper com tudo isso.” Esse é todo o drama de uma mãe de família que, num belo dia, resolve gritar: “Estou farta!”, mas não tem coragem de romper, e que Janine Bregeon, escritora francesa, tão bem soube transportar para um romance.


O HOMEM IDEAL


Porque muitas mulheres, no conceito de suas amigas, não se casam? Como as famílias constituídas explicam o fenômeno do celibato feminino? Foi feita uma enquete em São Paulo, e 58% responderam: “Não encontraram o homem que corresponde a seu ideal.” Se correta a informação, pode-se daí depreender que o casa- mento, para a solteira, quando for uma “comunhão a dois”, terá que ser isso mesmo. Do contrário, o celibato não será o fim do mundo. Outros motivos, como “sacrifício pelos pais”, “ninguém as pede em casamento”, “independência”, “teria relações com homem casado”, “temor ao homem e ao contato sexual”, “timidez”, completariam 42% das demais opiniões. E qual é a opinião da própria solteira? Ao entrevistar uma psiquiatra carioca, perguntei-lhe se era casada. Ela respondeu: “Se for publicar, pode dizer que sim. Mas eu sou solteira...” Porque essa dubiedade de resposta, essa hesitação em definir seu estado civil? A resposta talvez esteja no livro da psicóloga Carmem da Silva (que é casada), A Arte de Ser Mulher: “Alguns séculos de educação altamente restritiva e baseada em conceitos falsos deixaram às mulheres um pesado lastro de inibições, receios, hábitos de dependência e rotina mental.”


CONVITE PARA JANTAR


De qualquer forma, a solteira dispõe de uma liberdade que só lhe será útil se souber utilizá-la. Vivendo num mundo ator- doado pelo sexo, seria hipocrisia separar-se esse problema da vida celibatária. Disse uma entrevistada, que ocupa suas horas de folga no estudo de um idioma estrangeiro e aos sábados costuma jantar com amigos: “Mulher solteira não significa mulher fácil. Muitos homens costumam pensar assim. Porque aceitamos um convite para jantar, e porque vivemos sozinhas, eles creem que o resto virá por si... Eles se enganam redondamente” Uma outra queixou-se das dificuldades em poder alugar e manter um apartamento. “Além dos embirros com fiados, depósito, contratos humilhantes e olhares zombeteiros, é penoso ter que despender mais de 50% do meu salário para manter o apartamento só para mim. É por isso que nem sempre a mulher solteira mora sozinha: terá que repartir o apartamento com outra, para dividir as despesas.”


OS VELHOS AMIGOS


Outra, assim defende sua situação independente: “Nós, solteiras, sabemos preparar uma decoração a nosso gosto, cozinhar, receber amigos... Além disso, nunca estamos realmente sós: qual a mulher solteira que não tem sempre ao seu redor dois ou três velhos amigos, que estão sempre alegres de encontrar uma presença feminina?” Mas um grande número de mulheres solteiras vê seu sistema de vida como provisório, afinando com a mesma moral de 50 ou 100 anos atrás. Confessou-me uma cantora de bossa nova: “Não me caso não só porque isso seria o fim de minha carreira profissional, como também não tenho tido tempo para romance. Mas pode estar certo de que, quando menos esperarem, abandonarei a carreira. Pois o ideal é casar-me e ter filhos. Mais precisamente: três filhos”


CINCO MIL PROBLEMAS


Afinal, seria o casamento, realmente, o desejo in- contido ou disfarçado das mulheres solteiras? Zsu-Zsu Vieira é o pseudônimo de uma jornalista brasileira que, duas vezes ao dia, publica num jornal carioca uma coluna sobre problemas sentimentais. Tendo já recebido mais de 5 mil cartas em dois anos de jornalismo - e que vão ser reunidas num livro - eis como ela explica a situação das mulheres solteiras, com a sutileza da intuição feminina: “Pelo que me é dado saber de milhares de vida através do S.O.S. Senti- mental, firmei a mais absoluta convicção de que o grande sonho da mulher solteira, ou solitária, é o casamento ou a união duradoura e pública. Ela pode proclamar-se livre, dona de sua vida, igual ao homem, para dispor de si própria no terreno das trocas amorosas. Mas não é verdade. Não se casando, não será como antigamente - a solteirona azeda, recalcada ou beata. A mulher moderna esconde o fracasso íntimo sob a armadura da independência: trabalha, viaja, se projeta, muitas vezes conserva a mocidade e o gosto da vida. Mas no fundo, no fundo, será capaz de trocar tudo pelo casamento. Por preconceito? Talvez. Por desejo de segurança, de companhia, por instinto maternal, sei lá... Pode até dar errado. Mas cada uma pensa que no seu caso pessoal será diferente. Casar é o problema. Problema bíblico, universal, eterno. Homem e mulher - o casal.” Um inquérito realizado em São Paulo mostrou que 58% das mulheres ainda não se casaram porque não encontraram o seu homem ideal.


FATOS & FOTOS. Brasília, 15 de outubro de 1966

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