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Vanio Coelho

VANIO COELHO

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Começar de novo



Muitos homens notáveis ou apenas simples mortais, após sofrerem reveses, reuniram forças para levantar-se, sacudir a poeira e dar a volta por cima. Depois do tombo, tornaram-se vitoriosos. Outros, no entanto, preferiram o conforto da derrota a ter que lutar para recomeçar.


O homem é o único animal que bebe sem ter sede, come sem ter fome e faz amor fora do cio. Ou seja, é o único animal que tem desejos além de suas necessidades. De acordou com o grau de realização de suas ambições, a espécie se divide em triunfadores e frustrados. E é nas circunstâncias adversas, ao escolher a luta em vez do comodismo da autodestruição, que cada um revela sua grandeza.


Napoleão, retornando do exílio na Ilha de Elba para uma rentrée triunfal em Paris; o Barão de Mauá, reerguendo-se sempre após cada falência: Charlie Chaplin, reafirmando seu gênio depois de ter sido dado como acabado com o advento do cinema sonoro – são exemplos que confirmaram o mito da Fênix e renascer das cinzas. E Getúlio Vargas, voltando ao Catete do seu refúgio de São Borja, conduzido pelo voto popular depois do deposto; e De Gaulle, reconduzido ao poder que lhe era oferecido incondicionalmente após 12 anos de retiro espontâneo em Colombey-les deux-Églises.


Qualquer mortal pode recompor sua vida após incidentes de percurso, que o enriquecem; pode fazer do fracasso eventual um forte aliado, e de perdedor transformar-se em vitorioso. O diretor de um colégio católico, padre de origem européia, costumava contar a seguinte história exemplar: Num dia de nevasca, tendo de ir à missa, ele tentava caminhar em direção à igreja, mas tinha os passos tolhidos pelo gelo endurecido escorregadio. Quando já desistia, tentando voltar para casa, o mesmo gelo que o impedia de chegar à igreja tornou-se empecilho no sentido contrário. Ele dava dois passos à frente e era obrigado a recuar dói.


Assim, acabou por chegar à igreja.


Essa história, contada na aula inaugural de todos os anos letivos, para os alunos ginasianos, servia para lembrar que, apesar dos obstáculos que surgem a cada instante, algo nos impulsiona a prosseguir na nossa caminhada: a vontade de viver será sempre mais forte que qualquer sentimento negativo.


Se você não gosta de seu atual emprego, não precisa permanecer nele; se não gosta dos vizinhos, nada o obriga a ficar morando no mesmo lugar; se o seu ordenado não dá para viver, você deve procurar uma ocupação mais rentável. Sua vida se mantém estacionária porque você aceita as coisas da maneira como se apresentam. Mude seu modo de pensar e poderá transformar o mundo ao seu redor. Se não assumirmos o comando de nossas vidas, outros o farão por nós o decidirão onde devemos morar em que trabalhar e quanto ganhar.

Isso é, “quem sabe faz à hora, não espera acontecer”. Pensamentos positivos só não bastam; eles devem ser acompanhados de atos concretos. Mas se, por um lado, a rotina é cansativa, pular de galho em galho pode ser apenas escapismo.


Antes de tudo, faça uma rápida auto-análise: Você costuma culpar os outros por seus erros? Ameaça ou intimida os semelhantes, em casa ou no trabalho? Tem autocrítica em excesso e sente-se facilmente embaraçado na presença de estranhos? Costuma lamentar frequentemente como era boa a vida nos velhos tempos? Teme fazer novos conhecimentos?


Ou aceitar situações novas no trabalho? Tem medo de perder o emprego? De procurar outro? Perturba-se quando o patrão lhe dirige a palavra?


Quando você descobre que leva uma vida muito organizada, mas que não lhe traz nenhum enriquecimento espiritual, você deve indagar primeiro o que quer realmente.


S.P.S. era um brilhante advogado, casado com a filha de um político importante, e teve sua carreira pública interrompida pela cassação de seus direitos políticos. A autocomiseração, o álcool e atos irresponsáveis preencheram o vazio de sua vida durante dois ou três anos.


Desquitado, finalmente reencontrou apoio moral numa nova companheira, também ela saída de um casamento desfeito. Parte então para o grande negócio: adquire extensa área à beira-mar, levante recursos para montar a infra-estrutura e realiza um bem sucedido loteamento.




Quando Frank Sinatra rompeu com Ava Gardner, ficou com tal sentimento de insegurança que passou a temer que perdesse a voz. Tentou outro caminho: ser ator. Fred Zinneman deu-0lhe um papel no filme A um Passo da Eternidade, que viria a ser premiado com um Oscar. Sinatra recuperou sua autoconfiança e voltou a triunfar, não só como ator, mas também como cantor.


O ator Serge Reggiani, após longo período de afastamento, motivado por crises existenciais, teve o apoio dos amigos, que cederam suas melhores músicas para que ele se apresentasse como cantor no Olympia de Paris. O público, que pensou estar fazendo caridade, teve uma agradável surpresa com a alta qualidade do intérprete.


Em 1970, Pelé era um jogador mimado. Cansado da notoriedade, mais gordo. Nos treinos da seleção não se empenhava, não corria, gritava ordens aos companheiros. João Saldanha, ao ser afastado como técnico desabafou: “Pelé está acabado. Está até ficando cego. “Uma foto de Pelé usando óculos, publicada num jornal, jogou mais lenha na fogueira. Mais tarde, soube-se que a foto fora feita durante a gravação de uma novela, no qual Pelé interpretava um personagem que usava óculos.


“Começamos a definhar quando nos acomodamos, desprezamos novas aventuras e nos amedrontamos ante novos desafios.”


Ferido em seu amor próprio, Pelé não jogou a melhor Copa do Mundo de sua vida (ele participou de quatro), como também só pendurou as chuteiras oito anos depois. E até hoje não usa óculos; seu peso é o mesmo de há 11 anos.


Começamos a definhar quando nos acomodamos, desprezamos novas aventuras e nos amedrontamos em face de novos desafios. Quando abandonamos algo que nos é familiar, em troca do desconhecido, assumimos um risco. Daí a tendência a escorregar-se pela contramão do sucesso, situação só evitável com uma mudança brusca. Devemos nos auto-analisar para corrigir vícios de comportamento, criar nossas próprias oportunidades, ampliar nosso círculo de relações, desenvolver nossas qualidades, colocarmos-nos em evidência para triunfarmos.


Muitos sonham com o mito de Gauguin. Bem-casado, cinco filhos, muitos amigos, esse pintor pós-impressionista trocou uma existência burguesa pela vida primitiva numa ilha dos mares do Sul. Mas, impulsivo, com forte tendência à autodestruição, passou seus últimos anos amargurado, sofrendo no isolamento a falta dos aplausos da sociedade que menosprezara.


A linha que separa o fracasso do sucesso é muito mais tênue do que imaginamos. Não existem sucessos e insucessos absolutos. A própria concepção de sucesso varia de pessoa para pessoa.


B.S. é um cidadão comum que tirou vantagem da adversidade. Jornalista por vocação, não tinha coragem de exercer a profissão, ocupando funções burocráticas que o deprimiam. Foi necessária uma conjugação de fatos adversos para que ele, não tendo mais nada a perder, resolvesse mudar-se para uma cidade do interior, onde montou seu próprio jornal. E o jornal vai indo muito bem.


Mas nem todos se saem bem. Outros fracassam. Deixam-se regredir por ser mais seguro do que correr riscos. R.J. é um desses. Funcionário de empresa estatal, cheio de dívidas pessoais, trocou a estabilidade funcional por um acordo em dinheiro. Este, contudo, não foi suficiente para saldar os compromissos. Deu para beber, os débitos aumentaram, perdeu o apartamento, veio o divórcio, os amigos se afastam. Aniquilamento total, fracasso sem retorno.


Para o psicólogo Martins de Oliveira, “todo ser humano nasce com todos os componentes de que necessita para vencer na vida; apesar de esses componentes serem diferentes em cada um, são suficientes para fazer de qualquer pessoa um vencedor, autêntico, racional, consciente e criativo”.


Segundo ele, o futuro perdedor começa a se formar na infância. Quando as expectativas inatas recebem pressões negativas, tais como preconceitos específicos tipo “desse jeito você não vai conseguir nada na vida”, a criança começa a elaborar um plano de vida a partir das decisões que vai tomando a fim de se adaptar às interferências de seu meio. Essas decisões são voltadas para o fracasso, porque foram tomadas prematuramente e sob pressão.


“Na prática – continua Martins – não vamos encontrar muitas pessoas vencedoras ou perdedoras, mas sim o meio-termo, que podemos considerar como não perdedoras. Por isso verificamos que, numa comunidade, são apenas alguns os autênticos perdedores, aqueles que se consideram derrotados, semimortos, incapazes de mudar, chatos consigo mesmos, que às vezes chegam a se considerar bem-sucedidos, mas infelizes.”


A forma de pensar do perdedor caracteriza-se frequentemente por: 1) transferência de culpa; 2) fantasias e 3) medos e desilusões. “Se meus pais fossem ricos”, “se eu tivesse me casado com fulana”, “se eu tivesse outro chefe” são constantes alegações do perdedor para justificar seu fracasso. Ele almeja, mas não age para alcançar um objetivo: “quando eu me formar...” (mas não estuda); “quando eu conseguir outro emprego” (mas não procura). Vive constantemente assaltado por temores, tais como “e se eu for reprovado?”, “e se eu perder o emprego?”, “e se minha mulher me abandonar?”.


“Não resta a menor dúvida de que o perdedor necessita de uma ajuda especializada para levantar-se, sustentar-se sobre os próprios pés, integrar as partes fragmentadas de sua personalidade; mas o fundamental para que algum resultado positivo seja alcançado é o reconhecimento da situação pelo próprio indivíduo e sua vontade de mudar”, conclui o psicólogo.


L.A.D., publicitário paulista, vinha propondo idéias novas na agência onde trabalhava, mas já sem qualquer entusiasmo. Ele tentava, na verdade, entusiasmar as pessoas para que estas o contagiassem. Até que percebeu a fragilidade de sua proposta de vida. Já não havia sentido para ele numa profissão de que desgostava. Com o apoio da família, montou novo ramo de negócio que lhe restituiu a alegria de trabalhar, além da gratificação espiritual por ter tentado e conseguido mudar.


J.W. é uma mulher de meia-idade. Ela sabia que seu casamento ia mal. Poderia tentar salvá-lo, mas no momento, por estar envolvida, não tinha a lucidez necessária para descobrir as causas da deterioração de sua aliança e tentar corrigi-las, porque os problemas só se tornam evidentes depois que explodem. Assim, ela procurou estruturar-se mental e intelectualmente. Passou a freqüentar um analista e retornou aos bancos escolares. Hoje é mais uma doutora sem profissão, mas a universidade deu-lhe a auto-estima e confiança que lhe faltavam. Ela conseguiu tirar da cuca todos aqueles grilos da mulher até então preocupada apenas em ser aplaudida no pequeno círculo familiar e que retorna ao mercado de trabalho.


Só se vive uma vez. Por isso, devemos descobrir nossos pontos fracos. Se nos preocupamos com a opinião dos outros, tememos chamar a atenção ou reclamar, dizemos sim só para não nos aborrecermos, se temos grilos tipo sentimentos de culpa, receios de desemprego, divórcio e mudanças bruscas, para buscar uma vida mais afirmativa temos de controlar nossos sentimentos, libertamos-nos da necessidade de aprovação, estabelecer normas próprias de conduta, liberarmos-nos da obsessão de justiça e imparcialidade, ser mais realizadores e menos críticos, apreciar o mistério, eliminar qualquer sentimento de dependência e culpabilidade, não protelar mudanças essenciais, aprender a errar produtivamente.


“Conheci a miséria extrema, o que significa passar fome e tudo o que lhe segue. Isso não é nada ou quase nada. A gente se acostuma e, tendo boa vontade, a gente pode até rir disso. O sofrimento desperta o gênio. Só que não pode ser demais, senão mata... Com muito orgulho, acabei de conseguir bastante energia. Eu quis querer.” (De uma carta do pintor Paul Gauguin e sua filha Aline.)


“Temos que apreciar o mistério, eliminar qualquer sentimento de dependência e aprender a errar produtivamente”


*Reportagem produzida para a Revista Ele e Ela. Rio de Janeiro, agosto de 1981

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