Hoje vamos de Garcia Lorca (Verde que te quiero verde/ Verde viento/Verdes ramas...) para falar de um assunto recorrente na coluna: a defesa do meio-ambiente. Nosso centenário Colégio Catarinense, um dos mais sérios e queridos ícones da Ilha da Magia, instituição católico-educacional sem apego a bens materiais, conserva na Rua Esteves Junior um dos maiores patrimônios urbanos. Protegido da especulação imobiliária, é uma das poucas áreas verdes do centro. Seu campo de futebol, sempre verde e pouco usado, é também um colírio para os olhos de quem por ali tem a chance de caminhar. Tornou-se santuário de pássaros urbanos, como bem-te-vis, canarinho da terra, pardais, sanhaços, pombas rolas. Até um casal de quero-quero ali nidifica, toda primavera, criando cada ano seus 4 filhotes acompanhados pela garotada, que os protege. Mas, a cada verão, ao fazer a conservação, a firma de jardinagem utiliza- se de defensivos agrícolas que eliminam não só as ervas daninhas mas também os insetos, eliminando a fonte de alimento desses passarinhos. O alerta da coluna é para que a direção do Colégio, neste ano, proíba a utilização de agrotóxicos na recuperação do lindo gramado. E contabilize mais um crédito no coração de quem ama a cidade.
Veja a íntegra do poema de Federico Garcia Lorca: ROMANCE SONÂMBULO
Verde que te quero verde. Verde vento. Verdes ramas. O barco vai sobre o mar e o cavalo na montanha. Com a sombra pela cintura ela sonha na varanda, verde carne, tranças verdes, com olhos de fria prata. Verde que te quero verde. Por sob a lua gitana, as coisas estão mirando-a e ela não pode mirá-las. Verde que te quero verde. Grandes estrelas de escarcha nascem com o peixe de sombra que rasga o caminho da alva. A figueira raspa o vento a lixá-lo com as ramas, e o monte, gato selvagem, eriça as piteiras ásperas. Mas quem virá? E por onde?... Ela fica na varanda, verde carne, tranças verdes, ela sonha na água amarga. — Compadre, dou meu cavalo em troca de sua casa, o arreio por seu espelho, a faca por sua manta. Compadre, venho sangrando desde as passagens de Cabra. — Se pudesse, meu mocinho, esse negócio eu fechava. No entanto eu já não sou eu, nem a casa é minha casa. — Compadre, quero morrer com decência, em minha cama. De ferro, se for possível, e com lençóis de cambraia. Não vês que enorme ferida vai de meu peito à garganta? — Trezentas rosas morenas traz tua camisa branca. Ressuma teu sangue e cheira em redor de tua faixa. No entanto eu já não sou eu, nem a casa é minha casa. — Que eu possa subir ao menos até às altas varandas. Que eu possa subir! que o possa até às verdes varandas. As balaustradas da lua por onde retumba a água. Já sobem os dois compadres até às altas varandas. Deixando um rastro de sangue. Deixando um rastro de lágrimas. Tremiam pelos telhados pequenos faróis de lata. Mil pandeiros de cristal feriam a madrugada. Verde que te quero verde, verde vento, verdes ramas. Os dois compadres subiram. O vasto vento deixava na boca um gosto esquisito de menta, fel e alfavaca. — Que é dela, compadre, dize-me que é de tua filha amarga? — Quantas vezes te esperou! Quantas vezes te esperara, rosto fresco, negras tranças, aqui na verde varanda! Sobre a face da cisterna balançava-se a gitana. Verde carne, tranças verdes, com olhos de fria prata. Ponta gelada de lua sustenta-a por cima da água. A noite se fez tão íntima como uma pequena praça. Lá fora, à porta, golpeando, guardas-civis na cachaça. Verde que te quero verde. Verde vento. Verdes ramas. O barco vai sobre o mar. E o cavalo na montanha.
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